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A Tempestade


Escrevo hoje para uma amiga querida que está exposta ao vento forte, com os calcanhares assentados no barro, lutando para resistir a mais uma intempérie que não tem como controlar.

Existem pessoas que enfrentam a tempestade, existem as que fogem, existem as que semeiam (quase todos nós, me parece)... Entre as que enfrentam, temos aquelas que só enfrentam às tempestades que afetam os seus iguais. Assistem ao ciclone, tornado, tsunami arrastando estranhos, mas não se lançam no apoio ou resgate. Estranhos não importam, só os seus.

Eu conheço uma mulher que está no meio de uma tempestade. Essa mulher levou décadas para conquistar uma filha. Coisa comum. Já vi mães, filhos, irmãos levando um tempo enorme para conquistar familiares. Porque nascer numa mesma família, não significa gostar. Gostar pressupõe afinidade. Pois bem, essa filha conquistada pelo tempo e pelo sofrimento comum, liga todos os dias para a mãe para saber como começou o dia, atende ao telefone à noite para consolar dos trompaços que a ventania lhe causou.

Mãe e filha têm em comum a fé. Vai passar, vai passar, se consolam escutando o temporal sacudindo a casa. Procuram conversar sobre outras coisas, sabendo que por debaixo de todas as conversas existe o medo de que a casa não resista e caia.

Minha amiga sofre duplamente porque aprendeu que confidências sobre o que está passando não provocará solidariedade. Despertará condescendência de alguns e talvez certo “quem mandou comprar uma casa num descampado desses?” de outros. Ou ainda um “se eu estivesse ao relento desse jeito, aceitaria abrigo a qualquer preço ou enlouqueceria”.

Engraçado, como algumas pessoas acham que é fácil enlouquecer. Não é. O ser humano atura muito, suporta muita rejeição, carências, violência psicológica, física, dores antes de quebrar. Alguns nunca quebram. Vergam e se levantam de novo. Ou vergam, se incendeiam e renascem das cinzas.

Da minha experiência, penso que minha amiga está certa. Por que esperar guarida de quem não sabe o que é resistir dia após dia a um cotidiano duro? Quem é capaz de amparar alguém que está a mercê dos elementos não precisa que se peça. Oferece apoio, resgate.

Estou aqui oferecendo ao altar da Tempestade minha escrita. É só o que eu tenho para oferecer. Às vezes, ajuda.


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