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Desencanar

Interessante como algumas pessoas recomendam que os outros “desencanem” de amores,ou ódios. Como se fosse fácil, depois de dias, meses, anos de entrega a um sentimento, trocar de canal.

Todas as vezes que recomendei às pessoas queridas que desencanassem percebi minha fala, depois, como um movimento cruel ou irresponsável.

Desencanar demanda treino, musculação para a alma. De preferencia desde criança. Desencanar é uma atitude perante a vida.

Desencanar com muita facilidade, para mim, é sinal de sociopatia funcional, falta de intensidade ou de mentira. Fachada. Ninguém desencana fácil do que é difícil de abrir mão.

Um dia, em março de 2004, cheguei atrasada a minha aula de canto. Lembrei disso porque fui cantar sábado passado, fevereiro de 2017, com a mesma professora. Vera Versiani. A mesma música. I love them all.

Eu gostava mais de amar pessoas em 2004. Eu amava them all. E hoje amo menos e amo melhor.

Aprendi mais nesses 13 anos a meu respeito, a respeito das pessoas do que em toda minha vida anterior. Aliás, aprendi mais do em todas as outras vidas. Com o desvelamento dos meus autoenganos.

A gente devia aprender, desde criança, a dar nota como a Bruna Surfistinha. Ela dava nota aos homens e tirou disso uma carreira profissional de sucesso. Já pensou notas rápidas, certeiras desde pequena?

Uma coleguinha carrega suas coisas, sem pedir e não devolve? O amiguinho faz de conta que você não importa quando está conversando com os outros pirralhos? Aquele selvagem da turma ao lado lhe mordeu? Zero neles. Um Zero bem dado tem muito valor.

Poucas mulheres sabem dar nota a homens, filhos, amigos, parentes, companheiras, colegas. Eu nunca soube. Nota para quem simpatizo, gosto ou amo. E, principalmente, nota para mim mesma. É mais fácil dar nota para quem a gente detesta.

Em lugar disso, o que a gente aprende? A entender, a interpretar para entender melhor, entender para aturar, entender para inventar seres humanos que não existem.

Eu gostaria de ter criado, há 13 anos, uma tabela de zero a dez para a minha atuação.

Hoje, só minhas ações (e as de meus personagens) me importam. E o Zero tem importância ainda maior. Porque não dá para melhorá-lo.

Descobri que o sentimento de impotência é muito positivo. Se assumo como impossível determinar o que os outros fazem, impedir, melhorar tenho meio caminho andado para as escolhas possíveis. Se aceito as limitações de quem me faz feliz, fico bem. Se aceito as limitações de quem me prejudica, me sinto mal. Aceitar ou desistir.

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